☸ Tipitaka - a riqueza do Cânone em suas mãos

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Concepção, nascimento e juventude

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CAPÍTULO 1 - A VIDA DO BUDDHA HISTÓRICO

Concepção, nascimento e juventude

Vi.1 O nascimento maravilhoso de um grande ser

Aqui o Buddha se dirige a Ānanda, o discípulo que atuava como seu principal assistente pessoal. O Buddha já havia dito a ele várias coisas maravilhosas a respeito de sua concepção e nascimento, e agora pede que ele as enuncie de maneira que outros monges possam ouvi-las e se inspirarem com isso.

Então, o Bem-Aventurado se dirigiu ao Venerável Ānanda: “Ānanda, sendo assim, que você possa louvar as maravilhosas e formidáveis qualidades do Tathāgata”.

“Venerável senhor, ouvi e aprendi isto dos lábios do próprio Bem-Aventurado:

‘Ānanda, vigilante e compreendendo claramente 1 o bodhisatta apareceu no céu Tusita’.2 Venerável senhor, isso eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, vigilante e compreendendo claramente o bodhisatta permaneceu no céu Tusita’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, por todo seu período de vida o bodhisatta permaneceu no céu Tusita’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, vigilante e compreendendo claramente o bodhisatta partiu do céu Tusita e desceu ao útero de sua mãe’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, quando o bodhisatta partiu do céu Tusita e desceu ao útero de sua mãe, uma luz gloriosa imensurável superando a divina majestade das deidades apareceu no mundo com suas deidades, māras e brahmās 3, com seus povos, renunciantes, brāhmaṇas, reis e as massas. E mesmo naqueles medonhos intervalos de mundo aberto, de obscuridade e completa escuridão, onde o sol e a lua, grandiosos e poderosos como possam ser, não conseguem fazer sua luz prevalecer; lá também uma luz gloriosa imensurável superando a divina majestade das deidades apareceu. E os seres que lá renasceram perceberam-se uns aos outros devido a essa luz: “Amigo, de fato então também há outros seres que renasceram aqui”. E este sistema mundial de dez milhares tremeu 4, sacudiu e estremeceu, e uma luz gloriosa imensurável superando a divina majestade das deidades apareceu no mundo’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, quando o bodhisatta desceu ao útero de sua mãe, quatro jovens deidades vieram protegê-lo pelos quatro cantos de modo que nem humanos, nem não-humanos, nem ninguém pudesse prejudicar o bodhisatta ou sua mãe’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, quando o bodhisatta desceu ao útero de sua mãe, a mãe do bodhisatta era inerentemente virtuosa, evitando a morte de seres vivos, evitando tomar aquilo que não é dado, evitando a má conduta sexual, evitando a fala falsa e evitando vinhos, licores e intoxicantes, os quais são a base para a negligência’ 5. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado. …

… ‘Ānanda, no sétimo dia após o nascimento do bodhisatta, a mãe do bodhisatta faleceu e renasceu no céu Tusita’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, outras mulheres jovens dão à luz após carregar seu bebê no útero por nove ou dez meses (lunares), mas isso não ocorre com a mãe do bodhisatta. A mãe do bodhisatta dá à luz após carregá-lo em seu útero por exatamente dez meses’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, outras mulheres jovens dão à luz sentadas ou deitadas, mas isso não ocorre com a mãe do bodhisatta. A mãe do bodhisatta dá à luz em pé’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, quando o bodhisatta sai do útero de sua mãe, deidades o recebem primeiro, e então os seres humanos’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, quando o bodhisatta sai do útero de sua mãe, ele não toca a terra. As quatro jovens deidades o recebem e o colocam diante de sua mãe, dizendo: “Ó rainha, alegre-se, um filho de grande poder nasceu de você”’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, quando o bodhisatta sai do útero de sua mãe, ele vem livre de qualquer sujeira, intocado pela água, por humores, por sangue ou qualquer tipo de impureza, limpo e livre de sujeira. Ānanda, suponha que houvesse uma joia colocada sobre um tecido de Kāsi, e a joia não sujaria o tecido, nem o tecido sujaria a joia. Por quê? Por causa da pureza de ambos. Ānanda, assim também quando o bodhisatta sai do útero de sua mãe, ele vem livre de qualquer sujeira, intocado pela água, por humores, por sangue ou qualquer tipo de impureza, limpo e livre de sujeira’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, quando o bodhisatta sai do útero de sua mãe, duas correntes de água aparecem jorrando do céu, uma fresca e uma morna, a fim de banharem o bodhisatta e sua mãe’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Ānanda, tão logo o bodhisatta nasce, ele fica em pé firme no chão sobre seus pés; então, ele dá sete passos em direção ao norte, e com uma sombrinha branca sobre ele, ele olha para todos os cantos e pronuncia as palavras que estabelecem a liderança: 6

*Sou o superior no mundo;

Sou o melhor no mundo;

Sou o primeiro no mundo.

Este é meu último nascimento; agora, não mais existência renovada’*.

Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado.

… ‘Quando o bodhisatta sai do útero de sua mãe, uma luz gloriosa imensurável superando a divina majestade das deidades apareceu no mundo com suas deidades, māras e brahmās, com seus povos, renunciantes, brāhmaṇas, reis e as massas. E mesmo naqueles medonhos intervalos de mundo aberto, de obscuridade e completa escuridão, onde o sol e a lua, grandiosos e poderosos como possam ser, não conseguem fazer sua luz prevalecer; lá também uma luz gloriosa imensurável superando a divina majestade das deidades apareceu. E os seres que lá renasceram perceberam-se uns aos outros devido a essa luz: “Amigo, de fato então também há outros seres que renasceram aqui”. E este sistema mundial de dez milhares tremeu, sacudiu e estremeceu, e uma luz gloriosa imensurável superando a divina majestade das deidades apareceu no mundo’. Venerável senhor, isso também eu considero como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado”.

“Ānanda, isso sendo assim, você deveria considerar isto também como uma qualidade maravilhosa e formidável do Tathāgata: Ānanda, aqui, para o Tathāgata, as sensações são conhecidas à medida que surgem, à medida que estão presentes, à medida que desaparecem; percepções são conhecidas à medida que surgem, à medida que estão presentes, à medida que desaparecem; pensamentos são conhecidos à medida que surgem, à medida que estão presentes, à medida que desaparecem; Ānanda, você deveria considerar isso também como uma qualidade maravilhosa e formidável do Tathāgata”.

“Venerável senhor, isso sendo assim, eu também considero isso como sendo uma qualidade maravilhosa e formidável do Bem-Aventurado”.

Acchariya-abbhuta Sutta: Majjhima Nikāya III.118–120, 122–124, trad. G.A.S.

Vi.2 Profecia de sua grandeza futura

Esta passagem fala de como as deidades informaram a um sábio a respeito do nascimento do bodhisatta, e como ele entusiasticamente foi vê-lo, predizendo sua futura conquista do despertar.

O vidente Asita viu o Rei Sakka 7 e o conjunto de Trinta deidades 8, as quais estavam muito alegres e felizes, vestindo roupas limpas, louvando com entusiasmo, abanando um tecido.

Vendo que as deidades estavam contentes em suas mentes e animadas, prestando sua homenagem, ele disse o seguinte ali: “Por que a comunidade das deidades está extremamente feliz? O que é isso que elas celebram abanando um tecido?”

Mesmo quando havia uma batalha com as semi-deidades, e a vitória ia para as deidades (e) as semi-deidades eram derrotadas. Mesmo em tal ocasião não havia tal empolgação. Tendo visto qual maravilha os maruts (deidades) se tornaram eufóricos?

As deidades gritam, cantam e tocam música; elas batem seus braços e dançam. Eu pergunto a vocês, habitantes da crista do Meru: 9 Senhores, por favor, dissipem rapidamente minha dúvida”.

“O bodhisatta, joia excelente, nasceu no vilarejo dos sakyas, na terra de Lumbinī, no mundo humano, para nosso benefício e felicidade. Assim, estamos jubilantes, extremamente contentes.

Ele é o melhor dos seres, a pessoa superior, o touro humano, o maior dentre os povos. Rugindo como um leão poderoso, o senhor dos animais, ele causará a roda (do Dhamma) girar no bosque com nome de videntes” 10.

Tendo ouvido o pronunciamento, apressadamente ele desceu e chegou na residência de Suddhodana 11. Tendo lá se sentado, o vidente disse aos sakyas: “Onde está o jovem garoto? Eu também desejo vê-lo”.

Os sakyas, então, mostraram a criança, o jovem garoto, que resplandecia em glória, perfeito na compleição, como ouro incandescente polido por um ferreiro incrivelmente habilidoso na própria boca da fornalha, àquele chamado de Asita.

Vendo o jovem garoto flamejante como o fogo, purificado como o senhor das estrelas viajando pelo céu, como sol reluzente liberto das nuvens do outono, ele, alegre, sentiu abundante êxtase.

Os maruts levantaram no céu um guarda-sol com muitas hastes e um milhar de círculos. Abanadores de cauda de iaque com cabos dourados esvoaçavam para cima e para baixo; mas quem segurava o guarda-sol e os abanadores não eram vistos.

O vidente chamado Kaṇhasiri (Asita), aquele de tranças embaraçadas, tendo visto (o jovem garoto) como um ornamento dourado sobre um pálido cobertor vermelho, e o guarda-sol sendo mantido sobre sua cabeça, com a mente alegrada e jovial, o recebeu.

Tendo recebido o touro dos sakyas, examinando-o, ele, um especialista nas marcas e nos mantras, levantou sua voz com confiança: “Este, incomparável, é supremo entre aqueles de duas pernas (humanos)”.

Então, refletindo sobre sua própria partida, sentindo-se desanimado, lágrimas caíram. Vendo o vidente choroso, os sakyas disseram: “Certamente, haveria algum perigo para o jovem garoto?”

Vendo os sakyas infelizes, o vidente disse: “Não vejo qualquer mal destinado ao jovem garoto. Nem haverá qualquer perigo para ele. Este não é um ser inferior. Estejam contentes.

Este garoto atingirá o pico do despertar. Vendo o que é supremamente purificado, tendo simpatia pelo benefício da grande maioria, ele girará a roda do Dhamma 12. Sua vida santa 13 será amplamente conhecida.

Pouco de minha vida permanece; então, haverá morte para mim. Eu não ouvirei o Dhamma do incomparável; assim, fico desconsolado, tomado pelo desastre, miserável.

Nālaka Sutta: Sutta-nipāta 679–694, trad. G.A.S.

Vi.3 Pais

Aqui, um monge desperto dá os nomes dos pais do Buddha, com o pai do Buddha, num certo sentido, como sendo o “avô” do monge.

Um heroi de grande sabedoria de fato limpa sete gerações em qualquer família em que ele nasça. Eu penso, sakiya (Suddhodana), que o senhor é o rei das deidades, pois engendrou o sábio que merece ser assim chamado.

O pai do grande vidente é chamado Suddhodana. A mãe do desperto era chamada Māyā, a qual, tendo cuidado do bodhisatta em seu útero, após o desmanchamento do corpo se deleita nos três céus.

Ela, Gotamī 14 (Māyā), tendo morrido, tendo partido daqui, agraciada pelos prazeres sensoriais divinos, se deleita nos cinco veios dos prazeres sensoriais, cercada pelo grupo de deidades.

Sou o filho (discípulo) do Buddha, que tolera o que está para além da tolerância, o filho do incomparável Venerável Aṅgīrasa 15. O senhor, sakiya (Suddhodana), é pai de meu pai; verdadeiramente, o senhor é meu avô, Gotama.

Versos de Kāḷudāyī: Theragāthā 533–536, trad. G.A.S.

Vi.4 A família de Gotama

Esta passagem se refere ao filho do Buddha, que mais tarde foi ordenado monge por ele e atingiu o estado de arahant. O pai do Buddha permaneceu como laico e atingiu a entrada-na-correnteza, o primeiro nível de nobreza espiritual; sua madrasta (Mahā-pajāpatī) se tornou a primeira monja, e uma arahant; sua esposa também parece ter se tornado uma monja, e uma arahant.

Eles me conhecem como o “sortudo” Rāhula – sortudo por duas razões: sou o filho do desperto, e sou alguém com a visão das verdades.

Versos de Rāhula: Theragāthā295, trad. G.A.S.

Vi.5 Juventude extravagante

Esta passagem descreve uma vida inicial de grande conforto, mas, então, prossegue para reflexões sobre envelhecimento, doença e morte que afetam a todos nós.

Monges, eu vivi de maneira refinada, supremamente refinada, totalmente refinada. Na casa de meu pai, havia lagoas de lótus criadas unicamente para mim: uma onde lótus vermelhas floresciam, uma onde lótus brancas floresciam, uma onde lótus azuis floresciam, tudo por minha causa. Eu não usava sândalo que não viesse de Kāsi 16. Meu turbante era de Kāsi, do mesmo modo que minha túnica, minhas roupas de baixo e meu manto exterior. Um guarda-sol branco era segurado sobre mim dia e noite para me proteger do frio, do calor, da poeira, da sujeira e do orvalho.

Monges, eu tinha três mansões: uma para a estação fria, uma para a estação quente e uma para a estação chuvosa. Durante os quatro meses da estação chuvosa, eu era entretido na mansão para a estação chuvosa por músicos sem nenhum homem entre eles. Nem um vez eu descia da mansão. Enquanto servos, trabalhadores e empregados das casas de outros eram alimentados com arroz quebrado e sopa de ervilha, na casa de meu pai servos, trabalhadores e empregados eram alimentados com trigo, arroz e carne.

Monges, dotado de tal afluência, vivendo em tal refinamento, eu considerei: “Quando uma pessoa comum sem instrução, ela mesma sujeita ao envelhecimento, não para além do envelhecimento, vê um outro que é velho, ele fica horrorizado, humilhado e enojado, ignorante de que ele também está sujeito ao envelhecimento, não para além do envelhecimento. Se eu que sou sujeito ao envelhecimento, não para além do envelhecimento, ficasse horrorizado, humilhado e enojado ao ver outra pessoa que é velha, isso não seria apropriado para mim”. À medida que assim ponderei, a intoxicação da pessoa jovem pela juventude inteiramente diminuiu.

… [O mesmo é então dito substituindo “envelhecimento” por “doença” e, então, “morte”, de modo que] a intoxicação da pessoa saudável pela saúde inteiramente diminuiu. … a intoxicação da pessoa viva pela vida inteiramente diminuiu.

Sukhumāla Sutta: Aṅguttara Nikāya I.145, trad. G.A.S.

Vi.6 Prazer dos sentidos

Nesta passagem, o Buddha reflete sobre os prazeres de sua juventude e, então, sobre as limitações e perigos de tais prazeres.

“Māgandiya 17, quando antes eu vivia a vida em família, eu me divertia, provido e dotado dos cinco veios de prazer sensorial: 18 formas reconhecíveis pelos olhos, as quais são queridas, desejadas, agradáveis, amadas, conectadas com o prazer sensorial, provocativas da paixão; sons reconhecíveis pelos ouvidos; odores reconhecíveis pelo nariz; sabores reconhecíveis pela língua; sensações táteis reconhecíveis pelo corpo, reconhecíveis pelos olhos, as quais são queridas, desejadas, agradáveis, amadas, conectadas com o prazer sensorial, provocativas da paixão.

… Numa ocasião posterior, tendo entendido como realmente são a origem, o desaparecimento, a gratificação, o perigo dos prazeres sensoriais, e o escape em relação a eles, eu abandonei o desejo sedento pelos prazeres sensoriais; removi a febre pelos prazeres sensoriais; vivi sem a sede, com uma mente interiormente em paz.

Vejo outros seres que não são livres da paixão pelos prazeres sensoriais, sendo devorados pelos prazeres sensoriais, queimando com febre pelos prazeres sensoriais, entregando-se aos prazeres sensoriais. Não os invejo, nem me deleito nisso. Por qual razão? Māgandiya, há um deleite (meditativo) afastado dos prazeres sensoriais, afastado dos estados prejudiciais, que supera mesmo o prazer divino. Uma vez que me deleito nisso, não invejo o que é inferior, nem me deleito nisso. …

Māgandiya, suponha que houvesse um leproso, com feridas e bolhas em seus membros, sendo devorado por vermes, coçando as cascas das feridas abertas com suas unhas, cauterizando seu corpo com brasas ardentes. Então, seus amigos e companheiros, seus compatriotas e parentes, trouxessem um médico para tratá-lo. O médico prepararia um medicamento para ele, e por meio de tal medicamento o homem ficaria curado de sua lepra e ficaria bem e feliz, independente, mestre de si mesmo, capaz de ir para onde desejasse. Então, ele poderia ver outro leproso, com feridas e bolhas em seus membros, sendo devorado por vermes, coçando as cascas das feridas abertas com suas unhas, cauterizando seu corpo com brasas ardentes.

Māgandiya, o que você pensa? O homem ficaria com inveja daquele leproso por cauterizar seu corpo com brasas ardentes ou por seu uso do medicamento?” “Não, venerável Gotama. Por que isso? Venerável Gotama, porque quando há doença, há a necessidade de medicamento; quando não há doença, não há a necessidade de medicamento”. “Māgandiya, similarmente, quando eu vivia a vida em família, eu me divertia, provido e dotado dos cinco veios de prazer sensorial. … Numa ocasião posterior, tendo entendido como realmente são a origem, o desaparecimento, a gratificação, o perigo dos prazeres sensoriais, e o escape em relação a eles, eu abandonei o desejo sedento pelos prazeres sensoriais; removi a febre pelos prazeres sensoriais e agora vivo sem a sede, com uma mente interiormente em paz.

Vejo outros seres que não são livres da paixão pelos prazeres sensoriais, sendo devorados pelos prazeres sensoriais, queimando com febre pelos prazeres sensoriais, entregando-se aos prazeres sensoriais. Não os invejo, nem me deleito nisso. Por qual razão? Māgandiya, há um deleite afastado dos prazeres sensoriais, afastado dos estados prejudiciais, que supera mesmo o prazer divino. Uma vez que me deleito nisso, não invejo o que é inferior, nem me deleito nisso.

Māgandiya Sutta: Majjhima Nikāya I.504–506, trad. G.A.S.


  1. Totalmente alerta, totalmente consciente ou completamente sabedor. ↩︎

  2. Um dos muitos tipos de renascimentos celestiais. Uma característica sua é relatada como sendo o local em que bodhisattas vivem imediatamente antes da vida em que se tornarão um Buddha. ↩︎

  3. Isso poderia ser traduzido também como “com seu Māra e Brahmā”, i.e. o Māra de nosso mundo em particular e seu Grande Brahmā. ↩︎

  4. Sistema-mundial: um único sistema-mundial é como um sistema solar, que se estende tão longe quanto a lua e o sol se movem em seu curso e iluminam as regiões com sua radiância. Há também: aglomerados de mil desses sistemas; aglomerados galácticos de mil desses aglomerados; e aglomerados super-galácticos de mil desses aglomerados galácticos (Th.62). Entre sistemas-mundiais há intervalos-mundiais de escuridão intensa em que certos seres desafortunados vivem vidas solitárias. ↩︎

  5. Isso constitui os cinco preceitos éticos recomendados para o seguidor laico. ↩︎

  6. Literalmente a fala semelhante a um touro, isto é, como o som de um touro marcando sua liderança perante uma manada. ↩︎

  7. Sakka, chamado de rei das deidades, é o regente do grupo das Trinta-e-Três, um céu do reino do desejo sensorial. Na religião védica ele é conhecido como Indra, uma deidade vigorosa e por vezes intoxicada, mas no buddhismo ele é transformado num rei celestial virtuoso, chamado sakka, capaz ou competente, entendido como sendo um seguidor do Buddha. Curiosamente ele é casado com Sujā, do lado oposto das semi-deidades! ↩︎

  8. Uma referência arredondada às trinta e três deidades. ↩︎

  9. Meru, também conhecido como Sumeru (excelente Meru) é a mais alta montanha da mitologia indiana. ↩︎

  10. Isso se refere ao bosque de Isipatana em Varanasi, onde o Buddha fez seu primeiro discurso. ↩︎

  11. Suddhodana, o regente sakya de Kapilavatthu, é o pai do bodhisatta↩︎

  12. Isto é, colocará em movimento a influência de seu ensinamento (Dhamma). ↩︎

  13. A vida de celibato focado no estudo e prática do Dhamma ↩︎

  14. Forma feminina do sobrenome Gotama. ↩︎

  15. Que poderia significar “o Brilhante”, ou significar um membro da tribo Aṅgīrasa. ↩︎

  16. Um estado cuja capital era Varanasi. ↩︎

  17. Māgandiya era um hedonista que defendia o desfrute dos prazeres sensoriais. O Buddha aqui está lhe ensinando sobre as consequências maléficas de buscar o prazer sensorial. ↩︎

  18. É dito que um homem deriva tais prazeres de uma mulher; similarmente uma mulher os deriva de um homem. Assim parece que o prazer sensorial (kāma) primariamente significa o prazer sexual. ↩︎


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